“A poesia é a distância mais
curta entre duas pessoas”
Lembro-me, como se fosse hoje,
mas era de noite. Noites de luar. O luar entrava pelos vãos altos, e de peitoril
largo, muito largo. A rede da grade coava aquela luz amarelada, macia. Só retenho
a luz tenra, não de onde ela provinha. (Isso é ancilar, com o auxílio da
memória). O que ainda hoje vejo é o corredor, mais largo do que estreito, sem
ser rectilíneo, na verdade até tinha uma esquina, um ângulo talvez recto. E as
largas portas, para os quartos com a dimensão de quase alcovas. As portas
abriam para fora, para o corredor. Com o calor, tinham que estar abertas. E assim
estavam sempre. Sempre em ângulos diferentes. Aquele corredor era sempre o
mesmo, e sempre diferente. Tão inefável como nunca vi outro. A frase de Dylan
Thomas que “a escuridão é um caminho, a
luz um lugar” bateu fundo, acordou sensações ilustradas, visões, iluminou a
distância entre mim e elas. O tempo, são tempos. O tempo? Depende inteiramente
da forma como for vivido. Nunca esqueci aquele corredor. Andei numa nuvem,
entre o fumo e a ginga onde desafiávamos o uivo dos faróis quando
atravessávamos a estrada para, na esplanada nocturna, saborearmos a dita ginga.
E depois, no regresso, internava-mo-nos no corredor, antes de repousarmos na
penugem do leito que nos esperava. Tão bom!
Os pés, já dolorosos, os dentes,
já aperreados pelos freios, os olhos, húmidos e de focagem deslizante, e todavia,
a força em todos os membros. Sem prosápia, só com amor.
Não quero saber das adoráveis: o
amor são só possibilidades. Consumar? Uma agulha no palheiro! Que importa, se
há o palheiro? E onde há o palheiro, há agulhas. Cuidado! Não te piques!
Toda a gente se protege com a
distância. E só está à vontade, e só é, no vazio. Eu vou de peito feito, não há
parede nem muro que me detenha. Pois se são só fantasmas, tigres (belos e
inacessíveis) de papel!
O vinho corre como o sangue nas
minhas veias, enquanto aspiro ao caderno e à caneta, perfeitos.
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