sábado, 30 de março de 2013



“A poesia é a distância mais curta entre duas pessoas”

Lembro-me, como se fosse hoje, mas era de noite. Noites de luar. O luar entrava pelos vãos altos, e de peitoril largo, muito largo. A rede da grade coava aquela luz amarelada, macia. Só retenho a luz tenra, não de onde ela provinha. (Isso é ancilar, com o auxílio da memória). O que ainda hoje vejo é o corredor, mais largo do que estreito, sem ser rectilíneo, na verdade até tinha uma esquina, um ângulo talvez recto. E as largas portas, para os quartos com a dimensão de quase alcovas. As portas abriam para fora, para o corredor. Com o calor, tinham que estar abertas. E assim estavam sempre. Sempre em ângulos diferentes. Aquele corredor era sempre o mesmo, e sempre diferente. Tão inefável como nunca vi outro. A frase de Dylan Thomas que “a escuridão  é um caminho, a luz um lugar” bateu fundo, acordou sensações ilustradas, visões, iluminou a distância entre mim e elas. O tempo, são tempos. O tempo? Depende inteiramente da forma como for vivido. Nunca esqueci aquele corredor. Andei numa nuvem, entre o fumo e a ginga onde desafiávamos o uivo dos faróis quando atravessávamos a estrada para, na esplanada nocturna, saborearmos a dita ginga. E depois, no regresso, internava-mo-nos no corredor, antes de repousarmos na penugem do leito que nos esperava. Tão bom!

Os pés, já dolorosos, os dentes, já aperreados pelos freios, os olhos, húmidos e de focagem deslizante, e todavia, a força em todos os membros. Sem prosápia, só com amor.

Não quero saber das adoráveis: o amor são só possibilidades. Consumar? Uma agulha no palheiro! Que importa, se há o palheiro? E onde há o palheiro, há agulhas. Cuidado! Não te piques!

Toda a gente se protege com a distância. E só está à vontade, e só é, no vazio. Eu vou de peito feito, não há parede nem muro que me detenha. Pois se são só fantasmas, tigres (belos e inacessíveis) de papel!

O vinho corre como o sangue nas minhas veias, enquanto aspiro ao caderno e à caneta, perfeitos.





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