quinta-feira, 28 de julho de 2016

À beira das férias, interrompi os tratamentos. Recomeçarei a partir dos meados de Setembro. Sempre evitei esta toada prosaica por pensar que essa poalha a levaria o tempo, o que ficaria seria o que dele se libertasse. Mas suponho que esteja enganado, nada fica, nem o rasteiro nem o altaneiro: e, porventura, é o insignificante que mais tarde acende as luzes da memória.
Vou aqui também deixar claro -- sem receio de lamúrias -- que só encontrei pessoas com pouca coragem e sem fé ou sem imaginação para inventarem a sua própria vida.



sexta-feira, 22 de julho de 2016

É assustador o apagão da memória. (Do que acabamos de fazer...): como consolação apenas pensarmos que estávamos tão distraídos pela força da concentração nos nossos pensamentos que esquecemos tudo. Mas parece desculpa de mau pagador, para não encararmos a progressiva incapacidade de usar o piloto automático sem tirar as mãos do volante.
[Já outras memórias não são memórias mas presenças. À medida que avançamos vão-se apagando as luzes...]

segunda-feira, 18 de julho de 2016




"Grande e Estimado R.!

Aqui estou eu a corresponder ao teu feito epistolar. Do Amor, não outras coisas senão bocas se podem mandar, já que tal coisa é coisa que só na febril imaginação toma e se torna corpo. À medida que se alarga o tempo decorrido após a perca da inocência apenas nos podemos maravilhar como nos pareceu tão real quando o vivemos. É assim um fenómeno que vive na memória; no presente é apenas angústia e incerteza: no futuro já há algum tempo que não acreditamos.

Afastando tais fantasmas e indo ao concreto, tropeço logo num esquema estrutural que me apresentas, qual andaime para trepar ao cume da narrativa: sinto-me vítima de vertigens e tenho dificuldade de respirar em tais paragens.

Acredito mais triângulos das bermudas (se acaso a história se passa no Verão), ou no sacrossanto amoroso; mas aí tendo mais, não para as relações biunívocas entre os seus vértices, mas para o binário em que fatalmente haverá alguém excluído. E isto remete-nos para o adultério que, como dizia outro amigo meu, está sempre na génese de uma separação na medida que é o surgimento do terceiro elemento que despoleta o desfecho e o fim da relação. (É claro que o tal adultério pode não passar de uma fantasia). 

Claro que a rotina mata a paixão -- mas ainda está por descobrir o fogo eterno, ou o motor imóvel da sua marcha.
(Dão-se Alvíssaras!)

O filólogo professor [do filme A academia das Musas], diz bem: o amor imaginado é o real. Mas não posso dizer afirmar tal coisa assim desassombradamente, sob o risco de ser um descrente dessa religião, embora continue a acreditar na alquimia sem grandes ilusões, finjo que acredito e chego mesmo a acreditar.
Tudo que é autêntico é real, sobretudo o que imaginamos.

Obrigado pelos Poemas.


[não te apoquentes pelo tempo passado na toca do F.]"

sábado, 16 de julho de 2016

A vida não tem a ver com merecimento; e é fatal: passasse sempre ao lado dela.
Os velhos! (Os surpreendidos pela velhice!). Além de não valer a pena lutar por nada (pois se vem tudo dar na mesma!), torna-se omnipresente o papel da sorte no destino. É de tal forma que chega a ser o mesmo: a sorte, ou o destino.
Ufa!


sexta-feira, 8 de julho de 2016


Quedo-me tão pensativo quanto alguém que percorre com o olhar o fundo aquático temendo que a simples respiração enrugue a superfície e distorça a visão.

A ruína acaba por ser a essência das coisas e a última coisa a partir.



  1. Quem se proponha escrever deve ser indulgente consigo mesmo.
  2. Não procure elogios que pressuponham a exposição do trabalho em curso. Isto não quer dizer que não fale do trabalho; apenas não o divulgue. O desejo crescente de comunicação vai empurrá-lo para a conclusão do trabalho.
  3. Nas suas condições de trabalho, evite qualquer tipo de mediocridade quotidiana.
  4. Evite utilizar materiais escolhidos ao acaso para escrever. Eleja certo tipo de papel, caneta, tinta.
  5. Mantenha o caderno de notas rigorosamente atento ao mínimo pensamento.
  6. Seja circunspecto nas anotações e quanto mais o for mais elas amadurecerão. A palavra conquista o pensamento, mas a escrita domina-o.
  7. Não (nunca) pare de escrever por esgotamento do tema (quando nada mais lhe ocorre).
  8. Preencha as lacunas da inspiração reescrevendo cuidadosamente: a intuição despertará (reacender-se-à) no processo.
  9. Nenhum dia sem uma linha -- mas semanas, sim.
  10. Apenas considere acabado o trabalho quando tenha conseguido passar um dia e uma noite sem pensar nele.
  11. Escreva a conclusão da sua obra fora do local onde habitualmente trabalha.
  12. As etapas da composição:
          ideias - estilo - escrita
          A vantagem de passar a limpo, da reescrita, é que fixa a atenção apenas na forma.
          A ideia mata a inspiração, o estilo sufoca a ideia, a escrita recompõe o estilo.
 
    13. O trabalho é a máscara mortuária da sua concepção.

WALTER BENJAMIN