terça-feira, 24 de setembro de 2013

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

os cinco sentidos



Dos cinco sentidos
só a boca e os olhos
se podem abrir e fechar.
A boca para aprender a calar.
Os olhos para ver por dentro.
Os outros três
estão indefesos:
A pele até  esfolar,
Os ouvidos até rebentar.
E depois de aspirar todos os venenos,
e a respiração acabar:
Abrir e fechar: Voar




domingo, 22 de setembro de 2013


Metade da nossa vida é inventada,
e a outra é desperdiçada.
Interno-me no deserto,
onde todos os caminhos são possíveis.









domingo, 15 de setembro de 2013

reafirma a tua conclusão…




Nada há de mais definitivo do que a morte! E as suas pegadas naquilo que chamamos vida e que não é senão um seu interregno.

Há que colaborar com a vida: não a tentar meter numa embalagem e deixá-la lá apodrecer…  adivinhar a batida da hora, sentir o seu pulsar, ver a respiração no fluxo e refluxo das ondas.  Compreendê-la para cumpri-la. Ironia amarga de quem a deixou sempre ultrapassar as suas expectativas… a vida adiantou-se-me sempre no tempo. Ela não admite o constrangimento de qualquer plano, é indiferente a qualquer projecto porque este corresponde a um tempo deferido. É inexorável e não concebe, nem concede, alternativas ou hipóteses. É o que é, e nada mais, nem o que foi, nem o que será. Não se compadece com sonhos, para mal dos meus pecados. Não perdoa traições: só quando nos entregamos totalmente a ela, e só a ela, nos dá tudo o que tem e é. Mas de alguma forma é tarde: para saber tudo isto tive que pagar o preço. E o preço foi em tempo de vida, irrecuperável!

Se quis tudo é claro que só podia ter um pouco de cada coisa.

Tenho cada vez mais a noção do inútil que é o arrependimento mas não deixo de pensar nele face ás desilusões que me trouxeram até onde estou. O prazer devia ter sido a estrada para a realização mas, com a ilusão que o difícil compensa, entreguei-me ao sacrifício e ao adiamento e estraguei tudo. (Chegado aqui, e para ser justo, também deverei dizer que cada um tem o seu tempo e o meu nunca bateu certo com quem eu quis). Mas continuando, assim se explica o arrependimento e o seu absurdo. Como não há hipótese de repetição, de aperfeiçoamento, existe sempre a tentação de varrer tudo da mesa, da tábua rasa, do recomeço. Nem que seja com o pouco que resta! Mas ai, que cansaço! Começar até no último minuto. Isto também quer dizer morrer a cada instante.







domingo, 8 de setembro de 2013

A cada perda o seu luto




Penso que a partir de agora as coisas irão ser diferentes… Nunca pensei que o acto de escrever pudesse condicionar tanto a escrita. Pelo contrário! Idealisticamente, -- românticamente! --, julguei que o inverso era apanágio de mais elevada qualidade… e para tal consideração alicercei-me nos juízos feitos a partir dos exemplos esplêndidos dos ouvidos doentes de Beethoven, da coisa mental que era a pintura para Leonardo, no Borges, até no Camões! (A mão decepada de Cervantes seria a direita? Sim, não lhe devia ter sido permitido começar por ser canhoto…). Premonitoriamente até escolhi como pseudónimo, aliás obrigatório, num concurso de arquitectura, o nome do mestre cego do Convento da Batalha, Afonso Domingues…

(…) da sensualidade do escrever…
(…) da "produtividade da escrita" e como esta pode, até certo ponto, saber tomar conta dela…

Um aparte. Se a escrita, como alguns temiam, ameaça a memória como exercício, ela própria se organiza como memória, internamente, e mais banalmente, externamente.



quinta-feira, 5 de setembro de 2013



"[…]… Os novos não sabem que a experiência é uma derrota e que é preciso perder tudo para saber um pouco. (…) Já não ser escutado: é isso que é terrível quando se é velho. Condenaram-no ao silêncio e á solidão. Faziam-lhe notar que ia morrer em breve. (…) De repente descobre que o amanhã será semelhante, e depois de amanhã, todos os outros dias. E a irremediável descoberta esmaga-o. São ideias como esta que nos fazem morrer. Há quem se mate por não poder suportá-las (…) E há uma espécie desesperada de coragem na lucidez e na recusa de amar. […].


descontextualizando do "O Avesso e o Direito", de Camus