domingo, 31 de março de 2013
sábado, 30 de março de 2013
“A poesia é a distância mais
curta entre duas pessoas”
Lembro-me, como se fosse hoje,
mas era de noite. Noites de luar. O luar entrava pelos vãos altos, e de peitoril
largo, muito largo. A rede da grade coava aquela luz amarelada, macia. Só retenho
a luz tenra, não de onde ela provinha. (Isso é ancilar, com o auxílio da
memória). O que ainda hoje vejo é o corredor, mais largo do que estreito, sem
ser rectilíneo, na verdade até tinha uma esquina, um ângulo talvez recto. E as
largas portas, para os quartos com a dimensão de quase alcovas. As portas
abriam para fora, para o corredor. Com o calor, tinham que estar abertas. E assim
estavam sempre. Sempre em ângulos diferentes. Aquele corredor era sempre o
mesmo, e sempre diferente. Tão inefável como nunca vi outro. A frase de Dylan
Thomas que “a escuridão é um caminho, a
luz um lugar” bateu fundo, acordou sensações ilustradas, visões, iluminou a
distância entre mim e elas. O tempo, são tempos. O tempo? Depende inteiramente
da forma como for vivido. Nunca esqueci aquele corredor. Andei numa nuvem,
entre o fumo e a ginga onde desafiávamos o uivo dos faróis quando
atravessávamos a estrada para, na esplanada nocturna, saborearmos a dita ginga.
E depois, no regresso, internava-mo-nos no corredor, antes de repousarmos na
penugem do leito que nos esperava. Tão bom!
Os pés, já dolorosos, os dentes,
já aperreados pelos freios, os olhos, húmidos e de focagem deslizante, e todavia,
a força em todos os membros. Sem prosápia, só com amor.
Não quero saber das adoráveis: o
amor são só possibilidades. Consumar? Uma agulha no palheiro! Que importa, se
há o palheiro? E onde há o palheiro, há agulhas. Cuidado! Não te piques!
Toda a gente se protege com a
distância. E só está à vontade, e só é, no vazio. Eu vou de peito feito, não há
parede nem muro que me detenha. Pois se são só fantasmas, tigres (belos e
inacessíveis) de papel!
O vinho corre como o sangue nas
minhas veias, enquanto aspiro ao caderno e à caneta, perfeitos.
quinta-feira, 28 de março de 2013
Transporto comigo os meus hábitos e vícios.
Descubro quão insidioso pode ser o que nos desvia da simplicidade desejada, neste caderno de linhas que queria virtuais e ferreamente me amarram ao papel.
Ensinam-me que a servidão consentida se pode chamar liberdade.
A rapidez com que a tinta impregna o papel, a intensidade da sua cor, compensam a perca da precisão ambicionada do traço mais fino.
É preciso não descurar o cordão sanitário entre nós e os outros que nos põe a salvo das suas agressões. Sendo mais rígido do que o pretendido, tenho que levar até ao fim este caderno (e os que se seguem).
O resultado compensará: imaginarei que o escrevi do fim para o princípio.
O caderno de linhas é uma boa metáfora do que pretendi dizer: dá-nos a sua organização, impõe-a em nome da negação do vazio que procuramos e onde poderíamos encontrar a liberdade que desejamos.
quarta-feira, 27 de março de 2013
Acabaram-se as férias. Acabou-se o caderno.
Já não sonho com relâmpagos, só com a veia aberta pulsando ao ritmo das linhas. E em sentir-se assim sereno, correndo por dentro, fora do alcance das sombras que desfilam. É tão delicado este estado quando tudo estrondea à nossa volta... Não se sabe para onde é que isto vai. E depois? Se conseguires suster-te suspenso em cada momento não importa o que venha, -- a preocupação interrompe-te o planar, pesar-te-à nas asas, apertar-te-à o pescoço até te faltar o ar, deixarás de deslizar, avançarás aos tombos --, recorda o acordo entre o regato e o leito. O mundo é um espectáculo, um mar de sargaços e de sentimentos. No horizonte voam pontos e vírgulas. Se fechares os olhos verás, verdes e rutilantes, os saltos dos peixes-voadores e seguirás viagem com eles.
Às vezes o intervalo vale mais do que a sessão e um dia glorioso não necessita de ser luminoso, até pode ser chuvoso como o de hoje.
(A paz que este ritual me proporciona! Parar, pensar e contar, na língua do país estrangeiro por onde viajei, as notícias do que vi com os olhos da alma).
mais tarde
Mais uma morte. Pouco a pouco, o mundo mingua e a sua recordação cresce.
sábado, 23 de março de 2013
Contigo entrei no reino da poesia.
Já tinha desesperado de portas para o paraíso.
Viver... que palavra, que preocupação sem sentido para uma criança... tão preenchida com a vida e para quem essa é apenas uma questão esotérica que não faz parte do seu mundo luminoso. Elas é que sabem. Nós não fazemos mais do que tentar recuperar o que foi nosso. O paraíso perdido é o que procuramos. A recordação do mundo não fendido, a nossa entrega. E se era, se foi, o paraíso, não quer dizer que fosse isento de pesadelos. Os pesadelos eram do tamanho dos sonhos! Não!... Os pesadelos lá estavam, mas só aguçaram o nosso insaciável apetite. A voracidade da nossa vontade. Ah!... a saudade e o sentimento de culpa dos velhos que olham a infância com uma ternura, uma nostalgia que só flagela ainda mais a carne trémula e a alma finalmente amolecida. Ah!... e não sabermos quando o saber podia torcer o destino! Mas tudo é simples: tudo, a que o excesso conduz, será o norte, tenhamos nós peito aberto e amplo para o receber. A terra ensopará toda a chuva que cair e se for vasta nada acontecerá que não seja o reverdecer quando o sol voltar a brilhar. Nas crianças, com tudo a crescer, não há tempo para mais nada. Mas o segredo que é o seu sortilégio é simples: elas e o seu mundo são inseparáveis. Ao contrário de nós, que nos refugiamos, ou que fugimos, para um compartimento do qual fechamos a porta. E, esquecidos onde está, passamos a vida à sua procura.
(Procuro vertiginosamente esgotar as páginas do caderno; procuro o mais simples: sentir-me, e sentir-me bem).
sexta-feira, 22 de março de 2013
Dá-me a alegria de teres uma igual à minha.
Nada temas: o equilíbrio irrepremível fará sempre surgir o seu oposto.
É um recomeço todos os dias. Vatre retro, se é um re começo.
Eu posso morrer. Mas enquanto tiver forças posso lutar. Não é irónico?
Eu e tu, tão certo como o sol nos visitar todos os dias. Mas não importa, quem estaria à altura de recordar isso sempre que assiste a uma aurora ou se enche de melancolia a cada crepúsculo?
Talvez conheça melhor a morte do que a vida. Foi mais intenso.
Ir direito ao assunto é honrá-lo.
segunda-feira, 18 de março de 2013
Hoje, recordou-me a minha médica a pergunta que lhe tinha feito:
"-- Se não soubesse a idade que tinha que idade diria que teria?"
Vejo o meu corpo como a minha casa, a minha casca. Se eu for muito mais novo que a minha casa pouco faltará para a entender como uma prisão. O corpo pode ser esculpido, posso varrer o chão que os meus pés pisam. Mexendo-me, liberto-me da velha pele, como as serpentes. E concluo que os pés e os olhos são quem nos liberta, quem nos conduz à saída. Provisória, como tudo o resto. Mas temos que viver com isso.
A saída (que é o reverso da entrada) é o desafio de todos os labirintos... |
domingo, 17 de março de 2013
Nunca vi nenhum construtor como o amor!
Mas a ansiedade mata o amor, conforme disse Anais Nin. essa sacerdotisa do seu culto. Quantas e quantas vezes não vimos os seus efeitos? Até fisicamente corporizados...
Tenho uma biblioteca maior que a minha capacidade para a ler. Não que me importem os compêndios, é mais reconhecer que, perturbado, não me entrego com facilidade à leitura. Sinto dificuldade em me concentrar. Um lado do problema é, decerto, da condição que atravesso, mas outro, não menos importante, tenho que dizê-lo, é de não me apaixonar pelo tema. (Ah!...a faísca de um aforismo ou o transporte de um verso!)
E o tema, apesar do que dizem os neófitos, continua a ser omnipotente. (Como a relação entre o pormenor e o abstracto, e sobre isso disse já Mies van der Rohe que Deus estava nos pormenores).
A exigência tem muitas camadas, não é só o silêncio...
Enquanto arquitecto acredito que se possa (re)construir o mundo...
sábado, 16 de março de 2013
sexta-feira, 15 de março de 2013
quarta-feira, 13 de março de 2013
À leitura do mundo talvez possamos justapor outra ou outras se nos ativermos aos possíveis significados de tudo o que percepcionamos. O desenho que a A me deixou corresponde ao seu desejo de que eu permanentemente esteja acompanhado, acompanhado do seu sorriso? Custear-me-à apagar, borrar esse símbolo da bancada da minha cozinha... ainda que a tábua seja feita para recados rápidos e efémeros.
Estes pensamentos são âncoras que lanço ao leito do meu dia, como o apoio que o pé do atleta tacteia antes de se lançar na corrida.
Procurar a palavra precisa é por vezes como peneirar uma mão cheia de areão. Como não ficar emocionado com o escritor perdido no seu labirinto?
terça-feira, 12 de março de 2013
sexta-feira, 8 de março de 2013
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a espera impaciente da Primavera |
O amor correspondido permite-nos
conhecer os limites do que imaginamos e o amor não correspondido ajuda-nos a
conhecermo-nos a nós próprios, mas o mais trágico é o amor intermitente,
suscitado e logo a seguir negado. sucessivamente reaberto como uma ferida que
nos divide, nos põe em luta connosco mesmos e faz ruir a nossa firmeza até não
nos reconhecermos. A incerteza é irmã gémea da esperança e a esperança é uma
maldição. Sei que falo da paixão.
terça-feira, 5 de março de 2013
domingo, 3 de março de 2013
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