litoral austríaco,
1 de Março de 1912
[...] Agora, nas
minhas leituras, pareço alguém que se põe a comer, com gosto, mas à medida que
aparece o fundo do prato, começa a ter medo de achar a sua louça tão grosseira
e tão estragada, que soçobra na inquietação.
Noutros tempos,
cheguei, por vezes, a interrogar-me por que motivo os santos queriam tanto
infligir a si próprios tormentos corporais; só agora compreendo que esse gosto
do sofrimento até ao martírio era uma manifestação da urgência, da impaciência
de não voltarem a ser interrompido, nem incomodados, inclusivamente pelo que
lhes poderia acontecer de pior.[…]
[…] Admiro, admiro esse séc. XIV que foi
sempre, a meus olhos, o mais espantoso de todos, e o exacto oposto do nosso:
tudo o que é interior permanece interior e aí se desenlaça, sem real
necessidade, quase sem esperança de encontrar fora equivalências em estado e em
graus diversos […] Um sentimento não procurava, de modo algum, desdobrar-se
numa qualquer interioridade; mal tinha despontado, tomava a primeira forma que
aparecesse e passava também ele a sobrecarregar este mundo, pleno das únicas
coisas visíveis que a Grande Morte de 1348, ébria de tanta vida e não
conseguindo controlar-se, procurava ferir. […]
[…] Se esta situação se mantiver,
precisarei de começar a aprender latim: por que é que eu não estudei quando era
novo, quando se deve principiar pela fabricação da sua colher, mais grave
ainda, por aprender como é que se fabricam, a sopa tem muito tempo para
arrefecer. Esta é a minha situação. Que hei-de fazer?
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