quarta-feira, 3 de abril de 2013

Castelo de Duíno, perto de Nabresina,



litoral austríaco,
1 de Março de 1912



[...] Agora, nas minhas leituras, pareço alguém que se põe a comer, com gosto, mas à medida que aparece o fundo do prato, começa a ter medo de achar a sua louça tão grosseira e tão estragada, que soçobra na inquietação.
Noutros tempos, cheguei, por vezes, a interrogar-me por que motivo os santos queriam tanto infligir a si próprios tormentos corporais; só agora compreendo que esse gosto do sofrimento até ao martírio era uma manifestação da urgência, da impaciência de não voltarem a ser interrompido, nem incomodados, inclusivamente pelo que lhes poderia acontecer de pior.[…]

[…] Admiro, admiro esse séc. XIV que foi sempre, a meus olhos, o mais espantoso de todos, e o exacto oposto do nosso: tudo o que é interior permanece interior e aí se desenlaça, sem real necessidade, quase sem esperança de encontrar fora equivalências em estado e em graus diversos […] Um sentimento não procurava, de modo algum, desdobrar-se numa qualquer interioridade; mal tinha despontado, tomava a primeira forma que aparecesse e passava também ele a sobrecarregar este mundo, pleno das únicas coisas visíveis que a Grande Morte de 1348, ébria de tanta vida e não conseguindo controlar-se, procurava ferir. […]

[…] Se esta situação se mantiver, precisarei de começar a aprender latim: por que é que eu não estudei quando era novo, quando se deve principiar pela fabricação da sua colher, mais grave ainda, por aprender como é que se fabricam, a sopa tem muito tempo para arrefecer. Esta é a minha situação. Que hei-de fazer?




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