quinta-feira, 15 de setembro de 2022

(1ª versão)

 Já passei uma horas em tantos sítios...
Horas inesquecíveis, 
que recordo quando entro em certos locais.
Horas enterradas no passado
que é como quem diz, na memória
já que o passado não existe sem ela.
O mais trágico, -- e o mais frequente -- ,
são as memórias sem testemunhas.
Quando desaparecermos
desaparecerão também essas recordações
que ainda hoje
lá do meio do nevoeiro onde sobrevivem
nos apertam o estômago
e nos enchem os olhos de lágrimas.
Minto. Exagero.
É que o silêncio aperta o coração.


(Reescrita)

Entrei naquele café
onde certas horas e o teu retrato
ficaram para sempre.
Trágico e perturbador
é já não haver testemunhas.
Ficarmos condenados
à solidão e ao silêncio.
Quando desaparecermos
desaparecerão também 
as recordações
que nos apertam o estômago
que nos enchem os olhos
de lágrimas. 

Minto.         Exagero.
É o silêncio
a apertar o coração.

domingo, 24 de julho de 2022

A propósito de Alphaville, de Godard

Voltei ao mesmo local cinquenta e poucos anos depois. Para tentar perceber. Da razão de ser destas palavras passei a outro motivo mais lato, e mais importante, o que teria acontecido nesses cinquenta anos?
(A verdade é que o que teria então sido anunciado está hoje completamente vigente).

O que se teria passado? Como condensar num relance tantos acontecimentos? Em que uns projectam uma sombra que obscurece outros e os coloca definitivamente longe da luz...
No entretanto, a morte faz ocasionalmente as suas sortidas... como um aguaceiro rápido e repentino. Com a gravidade inexorável de tudo quanto existe neste mundo...
Queixo-me da falta de comunicação: não compreendi a tempo o que me diziam; sempre foi impossível fazer ver aos aos outros o que via; nunca estive ao mesmo tempo que os outros no mesmo sítio... enfim, cheguei sempre antes ou depois. Estive sempre no palco mas ao lado do que se passava na cena.
E de tempos a tempos estas irrupções da presença da morte. Como um gongo ou as pancadas do bastão no teatro que anuncia que o espectáculo se iniciará dentro de momentos.


segunda-feira, 18 de julho de 2022

 Domingo: gente como um enxame de moscas...

Fui dar um passeio para sair de casa pelo menos uma vez, nesse dia. Vivo num ermo, fui até à terra mais próxima. Que saudades da calma e serena vila piscatória que conheci! Liquidaram todos os locais de estadia, encheram as praias, incrementaram o uso dos automóveis e das colunas de som móveis... uma chusma de gente ruidosa e excitada para quem o ruído é necessário para saberem que estão vivos... Infelizmente uma terra quase morta que se ainda resiste é porque tem uma estrutura antiga que permanece em rituais como a tradicional saída da missa dominical...

segunda-feira, 6 de junho de 2022

 Estes cadernos foram sempre uma fórmula de refrigério.

Um parêntesis feliz.

Agora que a exaustão provocada pela febril actividade da minha dispersão se acentua também se condensa a imperiosa necessidade da calma induzida pela reflexão.

Recordo com nostalgia os interregnos da rotina dos dias  e para a aguentar o registo do caudal dos pensamentos e sentimentos.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2021

É com a morte que a vida se mede.
Quanto ao amor, ele é
a ilusão que é mais real
do que a realidade.

(16 de Dezembro de 2011)

quarta-feira, 1 de dezembro de 2021

 elevador


Entrei no elevador vazio,
estava escrito na parede:
"Proibido a crianças, 
não acompanhadas de adultos"
E pensei:
"E os adultos 
que levam dentro de si
as crianças?"
Mais:
"Serão crianças os que sabem
o significado
de 'Proibido"?
O meu olhar percorre a linha do contorno da sua perna.
Sinto um arrepio.

sexta-feira, 8 de Março de 2013